A cada dia que passa, parece que as pessoas estão cada vez mais fechadas nelas próprias. A irritação, raiva aumentam. As pressas sem fim. Quem trabalha no atendimento ao público sofre cada vez mais com os clientes. Mas que sociedade é esta? Da forma como vejo e sinto o que se passa, parece-me que a responsabilidade é multifatorial, e nessas várias dimensões as redes sociais representam um dos principais problemas. Porquê? Por motivos da evolução do cérebro.
As últimas etapas do seu desenvolvimento foram a maturação do nosso “cérebro social”. Esta área tornou-se enorme e está associada a várias funções que são indispensáveis para a análise social. Funções como análise de rosto e reconhecimento das emoções do outro, planeamento e memória, capacidade de contenção e adiamento de prazer, entre tantas outras.
Ao contrário do que as pessoas pensam, é a capacidade de adiarmos o nosso prazer que criou as condições para evoluirmos e conquistarmos o mundo. Adiar o prazer teve nas últimas décadas o seu potencial máximo, em que as pessoas eram treinadas para aceitarem os seus trabalhos, trabalharem acima de tudo e de todas as condições e depois receberiam a sua recompensa, quer na forma de salário, quer de reforma. Várias foram as gerações que adiaram o seu prazer, pela capacidade de construírem mais para si e para os seus e gozarem apenas a reforma. Essas foram as gerações que com uma resiliência única, deram aos seus filhos e netos muito mais do que tiveram. Muitos começaram sem calçado até e conseguiram dar a oportunidade aos filhos de estudarem em universidades. É um salto incrível.
Mas a sociedade mudou. E mudou para o estímulo do prazer. Agora, todos merecemos ser felizes e todos merecemos tudo. Todos podemos ser tudo. Mas como? Que planeta tem recursos suficientes para todos terem tudo? Eu mereço... Eu posso... Eu tenho o direito... Mas porquê? É inevitável se tenho o direito a tudo, que retire os direitos do outro e do planeta. Esse, só tem direito a ser escavado, usado e deitado fora.
As redes sociais estão no centro deste problema. Porque as redes sociais estão feitas para dar dinheiro aos seus donos. É como se cada vez que entrássemos nelas, entrássemos num Casino. É tudo luminoso e magnífico, feito para deixarmos o nosso dinheiro e alma, a troco de momentos de prazer. Assim, comportamo-nos muitas vezes com as redes sociais como se fosse o oxigénio que respiramos, fundamental para todas as atividades da nossa vida, incluindo ir ao WC. Mas quanto mais utilizamos, mais vazios ficamos. O nosso cérebro não tem capacidades ilimitadas e quando passamos horas a “mexer no telemóvel”, passamos horas a ser estimulados. Mas a distração é o principal que recebemos. Não recebemos nem prazer, nem informação. Só distração. Vêm-se pessoas bonitas, em locais bonitos, com comidas bonitas, joias sem fim, e todas elas felizes mostrando como a vida delas é boa (ou pelo menos a grande maioria). Trocam a alma em troco de uns likes/gostos ou qualquer outra moeda social. Mas nada disto enche a nossa alma, o nosso interior. O nosso cérebro não está preparado para a intensidade e rapidez da tecnologia. O problema, é que a evolução biológica é mais lenta que a tecnológica. E a tecnológica vai ganhar. Vamos acabar por aceitar meter chips e outras coisas no nosso corpo, para podermos interagir com este novo mundo. Haverá um futuro tecnológico de realidade virtual em que só poderemos entrar, se aceitarmos introduzir chips. E vamos aceitar acabar fechados em casulos de prazer, muito à semelhança do filme Matrix, porque “eu mereço”.
Que futuro vamos criar?